Com o início da telescola e das aulas à distância muito se tem falado das desvantagens deste novo método de ensino.
Não obstante as dificuldades que esta nova realidade tenha trazido para a vida de muitos pais e filhos custa-me francamente ver tantos posts negativos, ver tantos blogs de mães a queixarem-se, estamos todos cansados é certo, a pressão é grande, mas não deveríamos tentar ver o lado positivo de toda esta situação?
As crianças são seres cheios de energia e agora em confinamento ainda mais, mas não querendo ferir susceptibilidades, os animais também são e ainda não li nenhum post de alguém a queixar-se que está cansado do cão, gato ou hamster...
Outro aspecto que me preocupa é a nossa comunicação social, que e muito bem, entrevistou algumas crianças para perceber como estão a viver esta nova realidade mas para mim esqueceram-se de uma questão central, ou seja, por que motivo não perguntaram às crianças se estavam a gostar de estar com os pais em casa?
Durante anos um dos principais aspectos apontados como sendo a causa de muitos problemas das nossas crianças e jovens era efetivamente o pouco tempo que era passado em família. Diziam então os especialistas, e eu própria, o fiz várias vezes, que muitos comportamentos disruptivos das crianças e jovens eram “chamadas de atenção”. Na verdade muitas vezes eram, outras nem tanto.
Mas perante este facto pergunto-me por que motivo ainda ninguém perguntou às crianças: O que estás a achar de estar em casa com a tua família?
Tenho a certeza, até porque já o fiz, que muitos estão a adorar estes novos tempos. Independentemente de terem saudades dos amigos, muitos deles durante a sua rotina do dia a dia tinham era saudades dos pais! Agora puderam finalmente perceber o que era o tempo passado em família. A minha geração ainda teve o privilégio de ter tempo de qualidade com os pais, pois os horários de trabalho não eram tão exigentes nem se perdia tanto tempo em transportes, logo havia mais tempo em família.
Infelizmente o dia a dia “normal” de muitas crianças era ver os pais de manhã antes de entrar na escola e só os voltar a ver ao final do dia. Na prática passavam 2 a 3 horas num dia com os pais, sendo que talvez 1:30h fosse passada no trânsito muitas vezes sem qualquer comunicação.
Finalmente as crianças puderam perceber o que é passar tempo em família, ainda que em condições menos propícias à felicidade plena.
Nesta altura muitos pais dizem... mas temos que trabalhar e cuidar dos miúdos ao mesmo tempo. Sim têm, mas também têm mais tempo com eles em casa que era passado no trânsito. Relembro que não há muito tempo muitas mães ficavam em casa a cuidar dos filhos, e agora dizem...ah mas não estavam em teletrabalho. Pois não! Mas cuidavam das tarefas de casa sozinhas. Recordo que felizmente nos dias de hoje existem muitos homens que fazem imensas tarefas em casa e ajudam a mulher, logo na prática elas não estavam em teletrabalho mas tinham que sozinhas cuidar de todas as tarefas da casa e ainda educar os filhos. Muitas inclusive tiveram que ensinar uma profissão aos seus filhos pois não existiam as oportunidades que temos hoje para estudar. Por isso antes de reclamarem por favor parem para pensar um pouco.
Certamente se os vossos filhos lerem os vossos comentários não irão achar muita piada e numa altura em que muitos pais se queixam constantemente do bullying nas escolas parece-me a mim que o que tenho assistido não está muito longe disso...
Na realidade este comportamento vem confirmar algo que já se verifica há algum tempo que era o desinvestimento dos pais face aos filhos, mas acreditava que esta seria uma altura óptima para equilibrar a relação familiar. Muitos o fizeram com certeza, mas muitos outros não e sinceramente lamento.
Uma prova evidente deste “relaxamento” face aos filhos, e que para mim, sempre foi algo que me fez alguma confusão, foram as novas festas de aniversário. Sempre me questionei: será possível que os pais não conseguem arranjar um tempinho para organizar a festa? Ou será que é bem mais fácil ir até ao Mac mais próximo, pagar o almoço a 10 amiguinhos, gastar o dobro do que se fizesse uma festa em casa? Não faria mais sentido o filho perceber que os pais estiveram dedicados a organizar a sua festa transmitindo-lhe que tempo, dedicação e empenho numa atividade é também uma forma de amor?
Muitos apresentam como argumento o facto de viverem num apartamento, eu também vivia, e sempre tive festas. Tinha inclusive amigos que viviam em casas muito pequenas e lembro-me que cabíamos todos lá dentro e era maravilhoso ver as mães e familiares atarefadas na cozinha para que nunca faltasse nada na mesa redonda onde estavam 15 mas cabiam 4...
Foi a minha mãe que me organizou todas as festas de aniversário, não precisou de contratar ninguém para o fazer, e ela tinha dois trabalhos, arranjava tempo, nem que para isso ficasse durante vários serões a fazer florzinhas e chapeuzinhos. Os pais agora até têm o trabalho simplificado, pois muitos materiais adquirem-se facilmente numa loja ou até online, ainda assim contratam alguém. Não menosprezo o trabalho de quem o faz, mas certamente que as crianças iriam apreciar bem mais que fossem os pais a fazer tudo, afinal de contas essa seria uma bela prova de amor. Acredito que a nova tendência de colocar tudo nas redes sociais, acabou por inferir nestas escolhas, mas mais importante que uma mesa bonita que fica bem na fotografia é a dedicação e o amor que os pais podem colocar na tarefa de fazerem eles próprios a festa transmitindo aos filhos que tempo é amor.
Com todo este discurso quero alertar os pais para o facto de que muitos filhos estão a adorar estar este tempo convosco, embora talvez não tenham as ferramentas necessárias para vos transmitirem essa informação. Afinal de contas não foram habituados. Tenho quase a certeza de que se o programa Árvore dos Desejos fosse feito logo a seguir à quarentena teríamos mais crianças a pedir desejos para os pais ao invés de para os avós.
Aos pais deste país quero pedir para aproveitarem cada momento que estão em casa com os vossos filhos, não deverá haver certamente nada mais precioso do que apreciar o crescimento, desenvolvimento e transformação de um filho bem de perto, pensem que o tempo que passavam no trânsito pode agora ser aproveitado a desfrutarem dos vossos filhos e por favor lembrem-se que quando envelhecermos o mais provável é que muitos de nós não possamos sair de casa e certamente será muito penoso lermos comentários dos nossos filhos nas redes sociais a dizer que estão à beira do precipício por terem que nos “aturar”.
As crianças pediam por este momento há muito, espero sinceramente que depois desta quarentena a família seja mais valorizada e que se tenha mais calma na resolução de conflitos, pois tudo passou a ter um nível relativo de importância.
Infelizmente sou céptica e não acredito que a sociedade se altere para melhor, mas a esperança é a última a morrer e como são as crianças de hoje que serão os adultos de amanhã prefiro acreditar que novos valores lhes foram ensinados durante estes tempos. Espero sinceramente que percebam que os bens materiais não são assim tão importantes e que não há prenda no mundo que substitua a família e a importância da mesma em tempos de maior dificuldade.
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